6 de fev. de 2010

Ela


Acontece, nela.
Com ela.
Sem vontade, dela.
Vida, sem escolha
Acomodação.
Conformação. Conformidade. Ela...
É hora do jantar: o mal-estar anuncia sua vinda voluntária incorporando-se a penumbra acinzentada que vai caindo lá fora, nessas tardes de outono, e as tardes vão caindo geladas, as folhas vão caindo dos seus galhos, um peso, junto ao cair da tarde, caindo esmagante sobre você, mas você esquece desse seu sofrimento de mulher indesejável advertindo que o costume dessa coisa sem vida transforma-te numa cozinheira de raro tato feminino, onde você prepara com toda a sua criatividade esse requinte picadinho de miudezas anteontecidas em carne de panela, acrescentando um ovo de galinha caipira e deixa no brando da fervura, enquanto mais criativa ainda, talvez até invadindo a área da alquimia, arremata esses dois últimos tomates e essa meia cebola numa salada bem preparada, transmutando consistência e substância num simples sabor cotidiano de azeite e sal, aí você guarda esse pratinho na geladeira, a panela no forno e fica por alguns instantes parada, descansando o corpo sobre a mesa e imagina (ah! como imagina) a chegada do Júnior lá pelas tantas da madrugada, faminto, olhando para a panela cheia, relembrando que aqui é seu verdadeiro lar. Quando a você, esse pedaço de mamão com um copo de leite te fazem lembrar que a vida há muito tempo está sem graça nenhuma. E a esperança parece que se diluiu junto com o suor desgastante desses anos perdidos entre cozinha e sua pernas abertas à noite, naquela medida métrica do encaixe necessário, a medida exata para penetração daquela... daquela... sei lá! daquela coisa, que só de você pensar você já se sente novamente humilhada, e é melhor nem pensar mesmo, a inevitável noite se repetirá por mais uma vez e não vale a pena conflitar com o destino, é melhor cuidar da arrumação finaleira da cozinha e se preparar para assistir ao último capitulo da novela.

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